quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Agora que já não tenho calças...

...vamos ser sinceros:
O ser humano, além de ter problemas consigo mesmo, gosta de encontrar problemas nos outros.
Não se satisfazem com uma simples relação. Nesta deve aparecer qualidades, se não houver, deve aparecer defeitos. Se não houver qualidades nem defeitos, não há relação.
Não estou dizendo que as pessoas são perfeitas - já que não têm defeitos; - nem que são horríveis - já que não têm qualidades. Simplesmente estou revelando que estas são as primeiras coisas que as pessoas procuram nas outras.
Se definimos qualidades ou defeitos nos outros, é necessário que tenhamos uma referência, onde a qualidade seria o mais próximo da perfeição e os defeitos mais afastado.
E, amigos, essa referência é: o si-próprio.
Sim, sou perfeito e se você se distingue muito de mim, isto é um defeito seu!
E se você não está concordando com o que estou escrevendo aqui, saiba que isso se caracteriza como o maior de seus defeitos.

E assim você me diz:
-Mas você quer que olhemos os outros de que forma, senão considerando as qualidades e os defeitos?
Amigos, eu simplesmente respondo à vocês:
-Eu não sei, esqueça tudo que escrevi acima - eram mentiras.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Pois tirem tudo, só não tirem o nada

Podem começar. Comecem agora, estou preparado!
Comecem a tirar as coisas de mim, tirem tudo o que tenho.
Não ligo.
Tirem minha casa. Tirem minha comida.
Tirem meu ar, tirem minhas poesias.
Tirem tudo, tirem minhas calças!!!
Mas pedirei apenas uma coisas a vocês:
só não tirem de mim o que eu não tenho.
Não tirem meus sonhos, nem minhas esperanças.
Jamais tirem de mim aqueles olhos em que eu me perco,
aqueles olhos que jamais me olharam.

São as coisas que eu não tenho que me mantém.
Quem não gosta da nostalgia?
O "foi bom", ou o "deve ser bom",
é muito melhor que o "é bom".
Não preciso de nada além do nada para viver.

Então, meus amigos, peço-lhes:
Por favor, tirem até minhas calças,
mas não tirem de mim o que não tenho.

Marcelo Henrique Frote - 28/09/10

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Perguntas e Respostas

Querer algo impossível?
ou não saber o que quer?

Descobrir algo desagradável?
ou ficar sem saber?

Perder?
ou desistir sem tentar?

Ir e voltar?
ou apenas ficar?

Temer e encarar?
ou abaixar a cabeça?

Falar e não ser compreendido?
ou morrer calado?

Pior do que ter perguntas sem respostas
é ter as respostas,
mas não saber o que fazer com elas.


Marcelo Henrique Frote - 23/09/2010

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

A Hora Não é Agora

Tive que correr bastante, mas consegui entrar naquele ônibus! Ainda bem, era justo no "horário de pico", quando os ônibus atrasam e demoram em média meia hora. Ora, sem falar que estão lotados neste horário. Enfim, embora ofegante, eu estava feliz por ter conseguido entrar naquele ônibus. Obviamente não consegui sentar, já que era um micro-ônibus - costumo chamá-lo de Besta. Sem problemas. Caso tivesse conseguido lugar para sentar não estaria contando esta história agora.
Posicionei-me no melhor lugar para me segurar e o ônibus partiu. Oh, como estava cansado desse dia chato que custou a passar e ainda não havia terminado. As casas e luzes que passavam pela janela não me chamavam a atenção, assim como as pessoas que estavam na rua ou em seus carros. Já que não havia atrativos externos, rendi-me aos internos: pensava nas coisas que eu fazia, nas coisas que deveria fazer e, finalmente, no que eu queria fazer. Claro que elas não coincidiam, eu fazia o que deveria fazer, não o que queria. O que eu queria eu não sabia bem ao certo, mas sabia que não era hora para aquilo. Um tempo atrás, quando eu queria fazer o que faço agora, disseram-me mesma coisa - não era hora para aquilo. Sim, desisti de querer aquilo e isso tornou-se o que eu devo fazer agora. Será que quando eu puder fazer o que quero agora já vou ter desistido disso? Provavelmente. A hora não é agora, e a hora nunca é agora, e John K. Samson estava correto ao escrever essas palavras em The Reasons - and the time is never now.
Após ter lembrado das palavras dessa música percebi que não havia muito o que eu pudesse fazer, apesar de querer. Então, logo que esses pensamentos desapareceram, olhei para frente e deparei com um rapaz, olhei em seus olhos e, no mesmo momento ele olhou fixamente nos meus. Também estava em pé, estava com uma camisa de flanela azul, mochila nas costas e fone de ouvidos. Sua face era instigante. Quando o vento fresco entrava pela janela, a franja em sua testa balançava lentamente. Os olhos eram negros e sérios. Ele estava mascando chicletes. Cada movimento do seu maxilar fazia com que sua pele se movesse. Eu podia sentir em meus dentes cada mascada que ele dava, assim como a pele do rosto se movendo. Não era mais a pele de um adolescente, já era possível ver que o tempo passou por ali. Ao mesmo tempo que os olhos mostravam o sofrimento que o tempo - o mesmo que enrugou um pouco a pele - deixou, mostravam também uma simpatia, um convite. Não me arrisco a descrever sua fisionomia, sei que não faria bem, nem mesmo Tolstoi faria. Em sua orelha esquerda havia um pequeno brinco de argola. Era um jovem! Fones de ouvido, argola na orelha esquerda, cabelo um pouco comprido com uma franja na testa, mochila nas costas. Ora, era mesmo um jovem. Sim, era. O tempo passou por ele, deixou problemas, sofrimentos, um pele diferente. O tempo exigiu dele uma postura, uma tomada de decisão, uma responsabilidade pelos atos. Em seus olhos eu poderia ver vários "devo fazer", e mais que isso, haviam muitos "quero fazer". Mas estes estavam presos por um "a hora não é agora" que, ao se misturar com uma sensação de angustia, tornava-se: "a hora nunca é agora". E aí formava-se todo um sofrimento complexo que se manifestava no rosto. O sentimento que tive quando o vi foi indescritível, Dostoiévski não saberia também descrever.
O rapaz me hipnotizou até o momento que o apito do ônibus soou: era meu ponto. Assim que deixei de olhá-lo nos olhos e virei, percebi que ele fez o mesmo. Desci do ônibus, senti o mesmo vento fresco que balançava a franja acima daqueles olhos, mas dessa vez ele movia a minha franja. Alisei-a para o lado, já que caia em meu olho direito. Senti-me triste por saber que nunca mais veria aquele rapaz que tanto me interessou e, assim, falei para mim mesmo: "Nunca mais o verei".
Segui o caminho até minha casa sendo vigiado por uma estrela solitária que não havia se escondido nas nuvens. Sabia que o rapaz do ônibus era meu reflexo no vidro, que realmente nunca mais o viria, e sabia que ele não existia. Queria revê-lo, mas não era hora para isso.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Sabe a sensação de querer sair correndo?

... Então,
foi assim que tudo começou.
Começou ou terminou, não sei bem ao certo.
Tendo terminado deste modo não fica legal de contar.
Qual o sentido de começar pelo fim? Não há nem sentido nessa coisa aí de "começar do fim"...

Também, uma história, para ser dita, precisa necessariamente ser muito bem conhecida e esta não é conhecida por mim.
Sabe quando você sabe alguma coisa mas, na prática, você nem sabe se o que você está sabendo você realmente sabe ou não sabe?
Posso saber o que, mas nunca sei como...

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E aquele livro que não se fecha;
a palavra que sai muda;
a música que não tem refrão;

E no olhar tudo se cala.
Para ali ser dito o que realmente interessa.
Sem voz; sem medo.
O que nenhuma palavra pode dizer;
o que, por palavras, nunca seria dito.

E aquele pensamento: "deveria ter sido diferente!";
aquela despedida: "até logo";
e quando sabe-se que o logo é nunca mais.

E se não for, será como se tivesse sido.
Assim correrão dias;
e apenas "olás".
Assim nascerão sorrisos;
mas jamais olhares.

Porque é neles que estão a verdade.
Ver-se-á a luz;
mas para sempre os olhos estarão fechados.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

...

Tenho um amigo que a muito tempo atrás vivia falando:
"Você sabe, eu sei, então para que dizer?"
Tem coisa que nem falarei completamente, então.

Ah, ou melhor não falarei nada. Interpretem como quiserem, apenas:

"...entrei pela porta e vi aquela pessoa. A sala estava escura, não dava para ver seu rosto. Seus olhos eram negros, ou assim estavam por causa da escuridão. Eu não via detalhes, porém toda sua fisionomia estava em mim, em minha imaginação. Imaginei-a como eu queria e ela era perfeita. Não falei nada, palavras estragariam tudo! O silêncio era ótimo. Na realidade, não havia silêncio algum. Nossos olhos falavam, falavam alto, gritavam. Quando os meus gritavam, o som ecoava pela profundidade infinita dos olhos dela. E assim ficamos. Não sei se horas passaram, ou apenas minutos. Mas a eternidade poderia passar e eu não perceberia. Não ousei mexer um músculo, e ela estava como eu.
Infelizmente o homem nunca está satisfeito: eu queria mais; queria saber o que ela estava pensando. Nunca saberia, mesmo se ela ousasse falar. Ela não ousou.
Poderia passar mais algumas linhas descrevendo aquele momento - a perfeição nunca é perfeitamente descrita. Mas aquilo acabou, não me lembro exatamente como, mas acabou. Então estava eu num lugar completamente diferente, sentado. Em minha frente uma mesa fracamente iluminada por uma vela derretida até a metade. A iluminação era suficiente para enxergar isto - que estou escrevendo e que você está lendo agora. Fazia frio, também. Lá fora o vento era forte. Balançava minha janela. Balançava as árvores e derrubava a neve que estava acumulada nos galhos. Trazia também - com velocidade - novos flocos de neve - neve limpa - que clareava aquela que já estava marrom no chão. Nada mais fazia sentido: não havia escuridão, não havia olhos. Restou-me assoprar a vela. Ver a leve fumaça saindo de sua ponta e dissipando-se pelo quarto enquanto meus olhos acostumavam-se com a escuridão. E assim que se acostumaram, eu voltei a mergulhar nos olhos dela e..."

Marcelo H. Frote - 03/09/2010